top of page

Um ano surreal

  • Foto do escritor: Ana Paula Carvalhais
    Ana Paula Carvalhais
  • 26 de jun. de 2020
  • 2 min de leitura

São estágios. Assim dizem os especialistas em comportamento. Tenho lido algumas coisas a respeito. É como se, sem sair de casa, passeássemos por estações de sentimentos. Negação, depressão, raiva, resiliência... não sei exatamente aonde vamos parar. Esses sábios também afirmam que os sentimentos se mesclam em cada fase. Ou seja, no fundo, ninguém sabe muito bem sobre o que está acontecendo com as pessoas, nem com o planeta, assim como sobre o próprio vírus.


Mas foi numa reunião on-line que ouvi a definição mais perfeita para o momento. “Estou sendo engolida por isso tudo” - afirmou a mulher, mãe e profissional criativa. Empatia imediata. Identifiquei-me totalmente e a cena que me veio à mente foram os relógios de Salvador Dali. Aquele tempo derrete, derrama-se. Os ponteiros vagam e tudo está suspenso. Nunca na minha vida poderia imaginar que o surrealismo seria tão real e palpável como agora.


Devorados pela quarentena, acordamos com uma estranha sensação de culpa, corremos contra o tempo, cobramos excelência em tudo o que nos propomos fazer e, ao fim do dia, padecemos. Esgotados. Mas, ainda assim, felizes por mais uma batalha vencida. Ou procrastinada? Acho que envelheci uns dez anos nesses três meses. Tenho aprendido um bocado de coisa também.


De acordo com as estações definidas pelos sábios do comportamento, eu afirmaria, com alguma certeza, que me encontro na plataforma da raiva. Raiva desse governo, de quem esnobou a pandemia, de quem fingiu fazer isolamento, de quem celebra a flexibilização ainda tão longe da nossa realidade possível. Mas eu não quero ocupar esse lugar.


Queria, mais que tudo, poder transformar esse sentimento em gratidão. Agradecer a todas as pessoas que estão, de verdade, comprometidas com o distanciamento, fazendo sua parte – sem faz de conta nem auto boicote. Agradecer a quem entendeu que máscara não é vacina, que as velhas rotinas não cabem mais. Poder agradecer por cada encomenda de trabalho que chega, cada palavra de amizade, toda a beleza que nos inspira a seguir em frente.


É quase certo que o resto do ano continuará assim. Depois de saltarem pelo calendário, alguns cancelamentos já sinalizam que o importante agora é permanecermos inteiros para quando 2020 passar.




Imagem: obra A Persistência da Memória, de Salvador Dali (Espanha, 1931)


ree


 
 
 

Posts recentes

Ver tudo

Comentários


© 2019 por Ana Paula Carvalhais

  • Preto Ícone Instagram
  • Black Facebook Icon
  • Black Twitter Icon
  • Black LinkedIn Icon

Amarelo Comunicação Planejada

bottom of page